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Tempestade perfeita

Foto do escritor: José Maria Dias PereiraJosé Maria Dias Pereira

O IPCA-15 foi de 0,89% em agosto de 2021, acumulando alta de 5,8% no ano e de 9,3% em 12 meses. Os preços foram coletados entre 14 de julho e 13 de agosto e a metodologia deste índice é a mesma do IPCA (índice oficial de inflação), o que varia é apenas o período de coleta. A meta de inflação do Bacen é de 3,75% para 2021, com margem de 1,5% para mais ou para menos, ou seja, a inflação acumulada no ano já supera o limite superior da meta (5,25%). Portanto, o Banco Central errou feio na estimativa de inflação para 2021.


O IGP=M, índice que reajusta os aluguéis, subiu 0,6% em agosto e acumula alta de 16,7% no ano e de 31,1% em 12 meses. A diferença absurda no acumulado no ano e em 12 meses entre os dois índices pode ser explicada pela metodologia de cálculo de cada um, sendo que o IGP-M incorpora a variação do dólar e a alta do preço das commodities transacionadas no mercado externo, como petróleo, carne, soja, milho, etc.


Claro que esses números não espelham a realidade sentida no bolso do consumidor este ano, sobretudo os mais pobres, que comprometem a maior parte da renda com a compra de alimentos e tarifas. O preço da carne bovina, por exemplo, subiu cerca de 17% no ano de 2021 e 35% em 12 meses. O consumidor chinês nunca comeu tanta carne como agora, enquanto o consumo de carne do brasileiro se encontra no menor nível dos últimos 25 anos. E não dá para correr para a carne suína ou frango, já que esses alimentos também encareceram porque soja e milho entram na composição da ração desses animais.


A gasolina, cuja alta influencia os preços de todos os demais produtos por causa dos custos de transporte (aumento do diesel), subiu cerca de 40% em 12 meses. O aumento da bandeira tarifária, explicado pela compra de energia das usinas termoelétricas, resultou num adicional de 52% cobrado na conta de luz. O botijão de gás de cozinha é vendido no país a um preço médio de R$ 93,65, mas ultrapassa os 100 reais em alguns estados. Imagine um trabalhador que ganha salário-mínimo: ele compromete 10% do que ganha só com o gás para cozinhar os alimentos. Aliás, por falar em alimentos, vale lembrar o aumento dos preços de alguns itens mais consumidos, como óleo de soja (90%) ou o tradicional prato de arroz e feijão (60%). Segundo a estranha teoria econômica do presidente Bolsonaro, feijão e fuzil são bens substitutos: “não dá para comer feijão substitua por fuzil”!


O Produto Interno Bruto (PIB) diminuiu 0,1% no segundo trimestre de 2021, abatendo em pleno voo as previsões de recuperação da economia. Além da forte queda nos investimentos, esse resultado é explicado pela estagnação no consumo das famílias que, como vimos antes, tem sido duramente afetado pela perda do poder aquisitivo dos salários. A taxa de juros básica (Selic) foi aumentada para 5,25% e a previsão é que chegue a 7,25%, no final do ano. O aumento dos juros é o único instrumento que o Banco Central dispõe hoje para combater a inflação, mas tem como efeito colateral contribuir para a retração da atividade econômica. Se a economia estagnar, não há como oferecer trabalho para os quase 15 milhões de desempregados.


Tudo somado – inflação, PIB, juros, desemprego – temos todos os fatores causadores de uma “tempestade perfeita”, para usar um termo da moda. Essa é a discussão que importa. Mas, claro, não é a que interessa a Bolsonaro. Por isso, toda semana, ele inventa um factoide para fugir do verdadeiro problema, que, como sempre, é a economia. É impossível deixar de registrar a famosa frase “é a economia, estúpido!”, de James Carville, estrategista político de Bill Clinton, ao referir-se à frustração de Bush (pai), que concorria (e perdeu) à reeleição nos Estados Unidos. Pense na história recente do Brasil: todos os presidentes que se reelegeram (como FHC e Lula) tinham bons resultados econômicos para apresentar ao eleitor. Dilma também tinha, mas não em todo mandato. E, ainda assim, foi reeleita. Apesar de que, no caso dela, a sua saída de presidência se deu por falta de base política. A mesma (“centrão”) que hoje dá sustentação ao governo Bolsonaro.

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