O colar
Atualizado: 30 de mar. de 2023
O Cavalo de Troia foi um grande artefato de madeira construído pelos gregos durante a Guerra de Troia, como uma estratégia decisiva para a conquista da cidade fortificada de Troia. Tomado pelos troianos como um símbolo de sua vitória, o cavalo foi carregado para dentro das muralhas, sem que eles desconfiassem que no seu interior se ocultava o inimigo. À noite, guerreiros saem do cavalo e possibilitam a entrada do exército grego, levando a cidade à ruína. A história da guerra foi contada primeiro na Ilíada de Homero, mas o cavalo só é mencionado, brevemente, na sua Odisseia, que narra a acidentada viagem de Odisseu de volta para casa.
O cavalo é considerado em geral uma criação lendária, mas não é impossível que tenha realmente existido. Pode, mais provavelmente, ter sido uma máquina de guerra. Seja como for, desde a Antiguidade, foi citado ou reproduzido incontáveis vezes, inclusive em filmes. Ao longo do tempo, a expressão "cavalo de Troia" passou a ser usada como algo que parece bom, mas que provoca o mal. Como um vírus de computador, por exemplo.
No dia 26 de outubro de 2020, na alfândega do Aeroporto Internacional de Guarulhos (SP), os fiscais da Receita Federal desconfiaram do nervosismo de um passageiro que acabara de chegar, no voo Qatar-773, com origem em Doha. Pretendendo livrar-se mais rápido da fiscalização, o indivíduo optou pelo formulário “Nada a Declarar”. Porém, quando a bagagem de mão passou pelo aparelho de raio X, os funcionários da Receita Federal suspeitaram da existência de objetos de valor não declarados. Ao abrir a bagagem, os agentes federais se depararam com um cavalo dourado, de aproximadamente 30 cm., com as patas quebradas. Dentro dele, havia um estojo com um valioso colar de diamantes, no valor estimado de R$ 16,5 milhões (uma outra pasta, com joias masculinas de grande valor, está desaparecida).
O passageiro era Marcos André dos Santos Soeiro, o qual, naquele momento, após a apreensão das joias, informou fazer parte da comitiva do ministro de Minas e Energia, almirante Bento de Albuquerque, que voltava, naquele voo, de uma visita oficial a Riad, capital da Arábia Saudita. Pego em flagrante, Marcos solicitou que o ministro acompanhasse a fiscalização, imaginando, talvez, algum tipo de favorecimento. O ministro argumentou tratar-se de presente de um outro país, ou seja, bens de propriedade da União. Como nada havia sido declarado, para a Receita, a propriedade dos bens era do viajante, o qual, para reavê-los, deveria pagar imposto de importação e multas, cujo cálculo equivaleria ao montante estimado dos bens omitidos na declaração.
Quando esse episódio veio à público, descobriu-se que Bolsonaro (e Michelle), através de prepostos ou diretamente, tentaram reaver, por oito vezes, o colar, sem sucesso. A última, teria sido em 29/12/2022, dois dias antes de Bolsonaro deixar o poder. Desta vez, o encarregado da “missão” de resgatar o colar, foi Jairo Moreira da Silva, sargento da Marinha, que viajou para São Paulo num jato FAB. Tentou, em vão, argumentar que iria levar as joias para o acervo público do Palácio.
Diante do escândalo, o ex-ministro de Minas e Energia, criou várias versões. Na mais difundida, o colar seria presente do príncipe saudita para Michelle Bolsonaro. Estranho, porque nem Bolsonaro, nem Michele, foram a tal reunião no país árabe. Alguém daria um presente tão valioso sem conhecer a destinatária? Existem indícios de que haveria uma troca de favores, uma vez que, um mês depois do episódio no aeroporto, um fundo dos Emirados Árabes (com participação de investidores sauditas) comprou uma refinaria da Petrobrás, na Bahia.
Conforme descrito na Ilíada, sobre a Guerra de Tróia, o herói grego Aquiles morreu devido a uma ferida em seu calcanhar, causada por uma flecha, talvez envenenada. O colar, encontrado num estojo dentro da escultura de cavalo oferecido pelo príncipe saudita, foi o “calcanhar de Aquiles” da tentativa de “voo solo” de Michelle na política. Ninguém da Arábia Saudita confirmou a versão do ex-ministro. Tudo ainda é confuso. A cada dia que passa surgem novos desdobramentos, ou melhor, novos presentes (relógios, fuzis, pistolas, etc.). Alguns objetos do “roubo” estão sendo devolvidos, após determinação do TCU. Outras joias estavam em locais estranhos, como a casa do ex-piloto de fórmula 1, Nelson Piquet, que teria contribuído com 200 mil reais para a campanha de Bolsonaro. Estranho, nunca ouvi falar que Piquet tinha uma loja de penhores!
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