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Domingo no parque

Foto do escritor: José Maria Dias PereiraJosé Maria Dias Pereira

A semana passada, no fim da semana

João resolveu não brigar

No domingo de tarde saiu apressado

E não foi pra Ribeira jogar capoeira

Não foi pra lá, pra Ribeira, foi namorar

O José como sempre no fim da semana

Guardou a barraca e sumiu

Foi fazer no domingo um passeio no parque

(trecho da música Domingo no Parque, de Gilberto Gil,1968)

 

No dia 8 de janeiro de 2023, manifestantes descontentes com o resultado das eleições tentaram derrubar o governo democraticamente eleito. Pode-se argumentar que foi uma “tentativa”, já que o fato não se consumou.  Há casos em que o básico precisa ser lembrado, disse o relator do processo no STF, ministro Alexandre de Moraes: “se não fosse uma ‘tentativa’ sequer estaria havendo julgamento”, pois o fato seria a implantação da ditadura. Logo não haveria razão para estarem ali. Como disse um famoso compositor, os manifestantes perderam o senso. Como e por que pessoas comuns arruinaram suas vidas para sempre num “domingo no parque”? Isso faz parte da “divina comédia humana”, cantada nos velhos discos de vinil de um dos clássicos da MBP, da época da ditadura militar.

 

Ora direis, ouvir estrelas, certo perdeste o senso

Eu vos direi, no entanto

Enquanto houver espaço, corpo, tempo e algum modo de dizer não

Eu canto

(trecho da música Divina Comédia Humana, de Belchior, 1979)

 

Na letra da música de Gil, o outro clássico da MBP (gravado no mesmo ano do AI-5), fica subentendido que João e José são trabalhadores modestos cuja distração era ir no domingo ao parque de diversões. Podemos usá-los como uma metáfora do que aconteceu naquele ataque à praça dos Três Poderes, no fatídico 8 de janeiro.  Naquele dia, algo importante iria acontecer, mas nossos “heróis” ficaram intrigados com o enigmático título do convite: “festa da Selma”. Quem seria essa fulana? O horário programado, no início da tarde, também não favorecia. Cada um, por conta própria, foi sozinho ao evento.

 

Ir a uma festa, cuja anfitriã nenhum dos dois conhecia, foi uma decisão impensada. Chegando no local e no horário marcado, logo se depararam com uma multidão vestindo verde-amarelo, gritando palavras de ordem e pregando o golpe militar. Alguns estavam armados de facas, paus e pedras. Algo de ruim estava para acontecer. O melhor seria ir para casa. Mas resolveram se misturar com a turba ensandecida assim mesmo. Logo invadiram os palácios e começaram a quebrar tudo à sua volta. Os guardas facilitavam a entrada. Estavam sendo filmados, mas nem notaram as câmeras ligadas.  João e José, como muitos daquela multidão, foram presos. Pegaram muitos anos de cadeia. Seus advogados reclamaram terem sido as penas exageradas e alegaram que seus clientes teriam sido manipulados pelas redes sociais. Mas não convenceram a maioria dos juízes.

 

 Os sonhos de ditadura, para todos aqueles que estiveram lá naquele fatídico dia, se desvaneceram. Os democratas respiram aliviados. Por ora, o perigo passou. Oxalá o jardim da democracia permaneça sempre verde nesta Terra abençoada por Deus e bonita por natureza. Para aqueles que tentaram destruir o jardim, fica o aviso: a rosa é bonita, mas também tem espinhos. Atentar contra a democracia pode ter um preço alto. Como na letra da música de Gil, até acabar em tragédia...

 

Foi no parque

Que ele avistou

Juliana

Foi que ele viu Juliana na roda com João

Uma rosa e um sorvete na mão

Juliana seu sonho, uma ilusão

Juliana e o amigo João...

O espinho da rosa feriu Zé

(Feriu Zé!) (Feriu Zé!)

E o sorvete gelou seu coração

(trecho da música Domingo no Parque, de Gilberto Gil)

 

 

 

 

 

 


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