8 de janeiro
Estava à toa na vida, procurando um tema importante para o último artigo de 2024 e não foi preciso pensar muito. Bastou olhar as manchetes do final de semana. A “Folha” deu a manchete principal do sábado: “22% das ações sobre 8 de janeiro terminaram em acordo com réus no STF”. Esse título foi baseado em dados de grupo de pesquisa sobre os processos judiciais na Suprema Corte, sob relatoria do ministro Alexandre de Moraes.
Das sentenças de 1.379 ações penais, proferidas entre 8 de janeiro de 2023 e 5 de julho de 2024, e das alegações dos advogados de acusação e defesa, é possível chegar a esse número. A homologação dos acordos partiu da admissão de culpa, por parte dos acusados, e obrigação de serviços à comunidade, pagamento em dinheiro, proibição de uso de redes sociais, enquanto durar o acordo e obrigação de participação em cursos sobre os temas “democracia, Estado de Direito e golpe de Estado”. Das decisões do relator, seja no curso das investigações, seja sobre as decisões de prisão preventiva, 53,3% se referiam à determinação de prisão e 46,7% a revogação de prisão preventiva.
Sobre as decisões de mérito, tomadas pelo Pleno do Tribunal, houve divergência quanto à dosimetria da pena, especialmente entre os dois ministros nomeados por Bolsonaro e os demais membros. Por se tratar de julgamento de última instância, a possibilidade de recurso sobre as decisões do STF é bastante restrita, somente através dos chamados “embargos infringentes”, recurso que tem sido sistematicamente negado. Na Câmara dos Deputados, há um projeto de lei que prevê a anistia para os presos dos atos golpistas, mas que não foi colocado em votação até agora. É previsível a pressão de bolsonaristas nesse sentido, já que beneficiaria o ex-presidente, atualmente inelegível por decisão do STE.
Para garantir que a data de 8 de janeiro de 2023, marcada pelo ataque golpista às sedes dos três Poderes não será esquecida, haverá uma cerimônia no Palácio do Planalto com a apresentação da restauração das obras de arte que haviam sido depredadas (inclusive o famoso relógio, trazido ao Brasil por dom João VI em 1808), com a presença de Lula e de chefes dos demais Poderes. Após, haverá um abraço simbólico da praça dos três Poderes, convocado pela militância petista e outros movimentos sociais.
Passados dois anos do lamentável episódio de depredação das sedes dos três Poderes, após ter alcançado a “massa de manobra” do golpe, a Justiça começa a alcançar os “mandantes”. A Polícia Federal (PF) descobriu um plano de tomada do Poder, onde fica claro o envolvimento dos militares de alta patente. 25 militares foram presos, inclusive generais de quatro estrelas. Sem adesão dos comandantes, influência dos EUA (como em 1964), despreparo das lideranças, a invasão de uma massa descontrolada, tudo lembra a comédia italiana “O incrível exército Brancaleone”, na qual um jovem aristocrata, na idade média, recruta um grupo de maltrapilhos para reivindicar um feudo.
Agora o braço da lei deve alcançar os militares que conspiraram contra o regime. Defender a ditadura não pode ser confundido com liberdade de expressão, inclusive porque o que define ditadura é o caráter autoritário. Porém, a resistência da cúpula militar em aceitar cortes nos privilégios compromete o corte de gastos proposto pelo governo. O governo aceitou “regras de transição” até 2032. Até lá, esse assunto será esquecido e Lula se livrou desse “abacaxi”. Desconfio que a punição dos militares golpistas seguirá o mesmo caminho!
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