The good times are coming?
Como será a gestão da economia no terceiro mandato de Lula? Será igual à primeira (2003-2006)? Ou seja, muito próxima à do governo anterior, de Fernando Henrique Cardoso (FHC), que criou o Plano Real, cuja âncora se baseava no seguinte tripé: a) câmbio flutuante, com mobilidade de capitais vigiada pelo Banco Central (BC); b) regime de metas de inflação, com maior autonomia do BC e c) obtenção de superávits primários (receita fiscal maior do que a despesa, exceto juros) para diminuição da dívida e manutenção da confiança do mercado – condição necessária para estabilidade política e garantir a governabilidade.
Ou então, a política econômica do próximo governo Lula será semelhante à sua segunda gestão (2007-2010)? Nesse período, o governo do Partido dos Trabalhadores (PT) “pegou carona” numa fase ascendente do ciclo da economia mundial, com aumento dos preços das commodities que favoreceu o agronegócio brasileiro. O fato é que, graças aos superávits da balança comercial (excesso de exportações em relação às importações), quando Lula encerrou o segundo mandato, deixou reservas cambiais de 281,7 bilhões de US$. Até se deu ao luxo de fazer um empréstimo ao FMI.
Mas foi nas políticas sociais que o segundo governo petista mais se destacou, servindo de plataforma eleitoral em 2022. Programas de transferência de renda para os mais pobres (Bolsa Família), reunindo alguns programas já existentes no governo anterior, e o aumento do número de beneficiários, retirou um número expressivo de brasileiros da situação de miséria. Infelizmente, no governo Bolsonaro, o Brasil voltou ao “mapa da fome”, das Nações Unidas (ONU). A desigualdade social foi reduzida quando Lula governou: a participação dos 20% mais pobres na renda passou de 2,52%, em 2002, para 3,21%, em 2011. Um passo pequeno, mas significativo considerando que milhões de pessoas ficaram menos pobres.
Imagine, como no filme “De volta para o futuro”, que Lula, após o término do segundo mandato (2010), com a popularidade em alta, viajasse para o futuro em um carro-foguete, inventado por um cientista maluco, e acordasse em 2022. O cenário seria muito diferente daquele de 2010, apesar de que só conseguia se lembrar dos bons tempos do passado. Será que conseguiria trazer os bons tempos de volta?
Os dados levantados pela equipe que prepara a transição de governo, mostram que Lula desceu na época errada. O atual governo não dispõe de recursos, nem para fechar as contas de 2022. Embora o orçamento da União seja superavitário (pela primeira vez, desde 2013), explicável pela volta da inflação que “turbina” artificialmente a arrecadação, as despesas superam o “teto de gastos” – regra estabelecida pelo Congresso, segundo a qual a despesa não pode subir mais do que a inflação – o que leva ao bloqueio das verbas dos ministérios, sobretudo o da Educação, onde faltam recursos para pagar até as chamadas despesas discricionárias, de manutenção da máquina administrativa.
Como sinalizou na sua campanha à presidência, Lula beneficiará, em primeiro lugar, seus principais eleitores (os pobres) – não foi por menos que se disse contra o teto de gastos. Se aprovada a PEC de Transição, Lula terá seis meses para apresentar uma nova regra de controle de gastos ao Congresso. Enquanto isso, o peso da dívida no PIB deverá aumentar, significando que, no momento certo, Lula terá que enfrentar a questão do equilíbrio fiscal – condição necessária para queda dos juros, redução da dívida e retomada do crescimento.
Lula precisará de muita habilidade política para administrar o país, sabendo que metade dos eleitores não votaram nele. Ainda que, depois da diplomação pelo TSE (na segunda-feira), os antidemocratas enrolem as bandeiras e abandonem a porta dos quartéis, a radicalização política o acompanhará após a posse. Mesmo fazendo jus à sua fama de hábil negociador, Lula precisa que haja disposição ao diálogo. A esperança é que, à medida que o governo comece a apresentar bons resultados, a resistência diminua. Pelo menos, é o que as pessoas de bom senso desejam.
PS. Quais são o limite da conciliação de Lula? É a ética. Criar ministérios e ceder espaço do PT para partidos aliados nas eleições e, até mesmo, apoiar a reeleição de Lira à presidência da Câmara (em troca da aprovação da PEC da transição) é aceitável, nas atuais circunstâncias, para garantir a governabilidade. Mas, usar o discurso de encerramento dos grupos de transição, para dar a impressão que estava nomeando, naquele momento, Mercadante presidente do BNDES foi demais. Todos os que estavam sentados naquela mesa sabiam que Lula já tinha negociado com o "Centrão" a aprovação, "a toque de caixa" da mudança da lei das estatais, que estabelece quarentena de 36 meses participantes de campanhas políticas de ocupar cargo nas estatais. O PL aprovado muda o prazo para 30 dias. Será que o desgaste político para acomodar o velho amigo e coordenador da campanha, com o salário de 80 mil reais no BNDES, valeu a pena? No dia seguinte as ações da Petrobrás caíram quase 10% e a petroleira perdeu 30 bilhões do valor de mercado. Ninguém é bobo não. Sempre cito Marx nessas ocasiões, que disse que "a história se repete duas vezes: a primeira vez como tragédia; a segunda vez como farsa".
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