O pêndulo
Atualizado: 12 de ago. de 2022
Esclarecimento do autor: este artigo não foi publicado pelo jornal na minha coluna quinzenal (10/08/2022) sob a justificativa de "não permitir, no período eleitoral, manifestações de qualquer teor, sejam exaltações, ataques ou ofensas aos pré-candidatos da parte dos articulistas". Como o leitor irá constatar da leitura, trata-se de um artigo de "análise política" que nada tem a ver com "exaltações, ataques ou ofensas" e tampouco fere a legislação eleitoral (que não existe para jornais e somente para rádio e TV aberta). Além disso, abaixo da coluna existe a advertência de que "a opinião do jornal, não necessariamente, é a mesma do autor do artigo".
Trata-se de um "excesso de zelo do jornal", que acaba por ferir a LIBERDADE DE EXPRESSÃO, garantida pela Constituição, justamente num setor que mais dela precisa para exercer sua atividade com independência (a imprensa).
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Uma das consequências da divisão da política atual entre petistas (lulistas) e bolsonaristas é a falta de interesse pelo debate político – um dos pilares da democracia. Provavelmente, exauridos pelas brigas nos almoços familiares dos domingos, nenhum lado parece disposto a ouvir os argumentos do outro lado. Segundo a última pesquisa do Datafolha (final de julho/2022), 70% dos eleitores responderam que já estão decididos sobre em quem votar para presidente nas eleições de 2 de outubro. Petistas e bolsonaristas estão igualmente decididos: 80% responderam que estão dispostos a ir com Lula ou Bolsonaro até o fim (só 20% admitem mudar de opinião). A indecisão é maior entre eleitores de Ciro Gomes e de Simone Tebet, onde cerca de 60% dos eleitores de cada um admite que ainda pode mudar de ideia.
A disputa agora se dá mais no campo da rejeição, com cada um dos eleitores de Lula e Bolsonaro querendo provar, não que seu candidato é o melhor, mas que o outro é pior. No caso de Bolsonaro, 53% de eleitores não votariam nele de jeito nenhum, enquanto a rejeição de Lula é de 36%. É consenso entre os analistas de que ninguém com uma rejeição acima de 50% se elege. Ciente disso, Lula negocia apoios, à direita e à esquerda, “nunca antes” imaginados na história do PT. Um expectador distante das idas e vindas da nossa política, jamais imaginaria que uma das maiores referências do PSDB (Alkmin) seria aprovado, por unanimidade pela executiva do Partido, como vice de Lula. Não custa lembrar que o PSDB teve um papel importante no impeachment de Dilma Rousseff.
Para liquidar a fatura (vencer) no primeiro turno, Lula e o PT – o que, na maioria das vezes, significa a mesma coisa – Lula terá de provar a fama de conciliador. Até agora, saiu-se muito bem. Figuras como Luciano Bivar (União Brasil) e André Janones (Avante), desistiram de suas candidaturas à presidência da República para apoiar Lula no primeiro turno. Mas ganhar sem precisar ir para o 2 º turno, é difícil porque, neste caso, precisa ter um voto a mais do que a soma dos votos válidos de todos os outros candidatos, isto é, excluindo-se os votos brancos e nulos. Façanha obtida apenas por FHC, colhendo os louros do Plano Real.
Quando Lula deixou o poder (em 2010), com uma taxa de aprovação de 80% do seu governo, o PIB apresentava crescimento de 7,5%, a inflação anual era a metade do que é hoje, com aumento de 60% do salário-mínimo real e redução da desigualdade social da ordem de 25%. Pelo que se observa, o PT irá bater nessas teclas, quando começar o horário de propaganda eleitoral, porque sabe que a memória do povo é curta e muitos eleitores eram crianças nessa época. A ideia é explorar os contrastes com o fim do governo Bolsonaro, com PIB projetado de 2% no máximo, queda do salário-mínimo real e volta do Brasil ao “mapa da fome” da ONU. Lembrar o passado, pode ser pouco para Lula ganhar no primeiro turno, daí a necessidade de buscar apoios de adversários históricos, o que gera insatisfação das alas mais à esquerda dentro do PT.
Bolsonaro, que não tem o que mostrar para o eleitor para provar que merece ser reeleito, recebeu do “Centrão” uma boia para se salvar de perder no primeiro turno: o pacote “kamikaze” que, a pretexto de compensar a inflação dos mais pobres (armadilha que caiu a oposição para votar a favor), cria um artificial “estado de emergência” e passa por cima do princípio constitucional que proíbe benefícios sociais em ano eleitoral. Além do aumento de R$ 200 no auxílio às famílias carentes, usuários de gás, diesel e gasolina serão beneficiados. O custo estimado das medidas é de R$ 41 bilhões e o valor fica fora do “teto de gastos”. Além da irresponsabilidade fiscal, fica claro o caráter eleitoreiro do pacote, pois é válido só até o fim do ano. Custa a crer que a política tenha chegado a um nível tão baixo.
Nas redes sociais, só uma minoria segue os perfis de Lula ou Bolsonaro. Mais ainda, segundo o Datafolha, 43% pararam de falar sobre política no WhatsApp e 19% saíram de algum grupo. Num movimento pendular, agora se inverte o que ocorreu em 2018. Naquela ocasião, Bolsonaro ganhou as eleições por causa do antipetismo e não porque era o melhor candidato. Agora, inverte-se a situação e Lula beneficia-se do antibolsonarismo vigente. Cristalizou-se entre a esmagadora maioria dos segmentos da população, a percepção de que, neste momento, importa mais evitar a reeleição de Bolsonaro do que escolher o melhor candidato. Isso fica para 2026.
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