O espírito olímpico
O primeiro confronto entre gregos e persas, ocorrido em 490 a.C. na cidade de Maratona, foi uma ofensiva do rei persa Dário sobre a Grécia para anexá-la à Pérsia. Apesar de ter número de soldados muito superior ao dos gregos, os persas foram derrotados. A derrota enfraqueceu o Império Persa, que só teve condições de enfrentar os gregos novamente em 480 a.C., quando o sucessor de Dário, o rei Xerxes, ordenou uma nova invasão à Grécia.
Hoje, a cidade grega é conhecida por dar nome a corrida de 42,195 km (maratona), que encerra as Olimpíadas. Diz a lenda que um mensageiro do exército grego fora enviado a Atenas para avisar sobre a derrota dos persas. Após percorrer a longa distância e avisar a vitória, o mensageiro morreu de ataque cardíaco.
Desde essa época, os jogos olímpicos são sinônimo de superação - momento supremo em que os melhores atletas do planeta buscam quebrar os seus próprios recordes. Manifestações políticas, religiosas, de gênero ou raciais não são permitidas pelo Comitê Olímpico Internacional (COI), entidade encarregada de organizar, a cada quatro anos, os jogos olímpicos. Em 2024, a cidade escolhida como sede dos jogos foi Paris. Porém, com um diferencial: os jogos estão sendo praticados a céu aberto ou em ginásios que já existiam na cidade.
Ao contrário da prática de investir uma fortuna para sediar os jogos em novas instalações - como aconteceu com o Brasil, onde a vila olímpica no Rio de Janeiro virou uma “cidade-fantasma” após terminar as olimpíadas - o governo francês deixou de gastar uma vultuosa quantia ao aproveitar a infraestrutura existente. Apesar de gerar um certo desconforto para os moradores da cidade-luz (exemplo, maior movimento no metrô) o retorno financeiro para o comércio, hotéis e serviços, certamente superou o aumento temporário da população da cidade francesa. Outro exemplo de contrapartida foi a despoluição do rio Sena para a prática dos jogos aquáticos, o que reverterá em benefício para os moradores locais.
Para os turistas, nada pode ser tão satisfatório como o fato de unir o útil ao agradável, qual seja, a possibilidade de assistir o embate entre as melhores atletas mundiais e tirar fotos bem perto, tendo ao fundo o cenário da Torre Eiffel. Para os atletas, acredito que ganhar uma medalha – ou simplesmente participar – deve ter tido um “gostinho especial” por se tratar de Paris. Apesar do aumento da influência da extrema direita na política francesa, a França ainda é um dos países europeus mais tolerantes com os imigrantes.
Em agosto de 1936, Hitler deu início à 11ª olimpíada da era moderna, através de um novo ritual olímpico: um corredor chegou ao local carregando uma tocha que havia sido trazida, por revezamento, desde o local dos antigos jogos em Olímpia, na Grécia. As imagens daquele evento esportivo foram manipuladas para estabelecer um elo entre a Alemanha nazista e a Grécia antiga, simbolizando o mito racial de que a civilização alemã, superior às demais, era a herdeira da cultura "ariana" da antiguidade clássica. Jesse Owens, americano, foi o atleta negro que ganhou quatro medalhas nas olimpíadas de Berlim, provando que a supremacia ariana não passava de uma farsa.
Duas palavras resumem tudo que a olimpíada representa: espírito olímpico. Essa visão do esporte afasta a impressão errada de concorrência entre os competidores. Existe, sim, respeito e admiração - acrescentaria orgulho por representar seu país - pois, cada um, é um competidor de si próprio, procurando superar as próprias “marcas”. Cada derrota é um desafio para ser vencido no futuro. Melhor exemplo dessas virtudes: a foto com as duas ginastas norte-americanas (medalhas de prata e bronze) reverenciando, de brincadeira, a ginasta brasileira Rebeca Andrade pela obtenção da medalha de ouro.
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