Em defesa da ética
A indicação, pelo presidente Lula, do economista Marcio Pochmann para a presidência do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) “não foi bem recebida por economistas do mercado financeiro”, resumiu a CNN no seu site de notícias. Essa afirmação é representativa da falta de capacidade crítica da maior rede de notícias do mundo. O pior é o ataque anônimo, que jamais deveria ser publicado. “Ele é ruim de estatística e não entende nada econometria”, disse um economista do mercado financeiro que preferiu não se identificar, segundo a CNN. Isso mostra as “relações perigosas” entre economistas do mercado financeiro e a grande mídia eletrônica, que costuma elaborar as suas pautas com base sempre nos mesmos “palpiteiros de plantão”.
Mas, desta vez, o comportamento de alguns veículos da mídia foi longe demais. Sem nenhuma preocupação com a destruição de reputações, opiniões de desafetos do indicado por Lula foram simplesmente incorporadas no noticiário como verdades. Sem se preocupar com o risco de perda de credibilidade, jornalistas (analista econômica) respeitáveis, como Mirian Leitão (GloboNews), deram voz a opinião pessoal do economista (dono de Corretora) Edmar Bacha, ex-presidente do IBGE, que certamente não “morre de amores” por Pochmann.
Bacha, sem dúvida, é um economista respeitado no meio acadêmico, mas hoje seus interesses vão além da teoria. Além disso, sua gestão foi curta no IBGE. Mas nada justifica os argumentos que usou para criticar a indicação de Pochmann. No site da CNN, Bacha declarou: “o país vai colocar como centro do sistema alguém que fez uma desastrosa administração no Ipea. É um enorme risco para a credibilidade do sistema estatístico nacional”. Sinceramente, isso é argumento que se use? No mínimo, Bacha deveria se retratar para o bem de sua própria reputação.
Os ataques vieram de várias frentes. Para ficar num único veículo da imprensa, vejam o que disse o jornalista veterano, conservador de direita, Boris Casoy à CNN: “Pochmann não tem credibilidade junto aos agentes da economia brasileira. Pode ter muita credibilidade em determinados círculos de caráter ideológico, cujo olhar é para trás e não para adiante”, e prosseguiu criticando o indicado ao IBGE por suas “posições retrógradas, antigas, [com] uma linguagem de folhetim de organização estudantil, uma coisa que não se usa mais. É muito triste”. Triste mesmo é o depoimento do jornalista. Se há alguém com posições antigas é o próprio Casoy, o que pode ser constatado até pelo cenário “retrô” onde faz seus comentários.
Conheço o Marcio há muitos anos. Tenho admiração e respeito pela sua trajetória como economista desde que ele coordenava um Núcleo de Estudos sobre o Trabalho, na Unicamp. Como essa também é a área de concentração do meu doutorado em Economia foi natural a nossa aproximação como pesquisadores desse assunto. Tanto que, quando era Coordenador do Curso de Ciências Econômicas da Unifra (hoje UFN), trouxe o Marcio para fazer palestras naquela instituição por três vezes. Ele é gaúcho de Venâncio Aires. Lembro que, da primeira vez que o convidei, a sua única exigência foi que conseguisse um carro para visitar os parentes naquela cidade que fica perto daqui. Jantamos algumas vezes. Orientei um trabalho de graduação na UFSM, cujo aluno (hoje professor) foi, posteriormente, orientado pelo Marcio (no doutorado) na Unicamp.
Muito antes, Pochmann já era um economista respeitado em todo o país. Ele é graduado em economia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, em 1984 e tem doutorado também em economia pela Unicamp (1993), onde leciona desde 1989. Já venceu o prêmio Jabuti de literatura três vezes, por livros e artigos nas áreas de economia e desenvolvimento. O currículo dele é extenso e não precisa que ninguém o defenda.
Quando estudou Economia na UFRGS, Marcio foi colega do professor Cláudio Einloft, ex-colega da UFSM lamentavelmente já falecido. Cláudio e eu já nos conhecíamos desde antes de ingressar na UFSM, já que trabalhamos juntos na Fundação de Economia e Estatística (FEE), em Porto Alegre. Embora Marcio não se lembrasse do Cláudio na época da Faculdade, certa fez comentei com ele o que o Einloft, do jeitão sério dele, disse a seu respeito: “Quem diria que aquele magrinho iria tão longe”. Essa frase soa hoje como premonição.
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