top of page
Buscar

A reforma tributária

Foto do escritor: José Maria Dias PereiraJosé Maria Dias Pereira

Há décadas, se não estou enganado, desde antes da Constituição de 1988, que se fala da necessidade urgente de fazer uma “reforma tributária”. Quanto mais não seja, pelo descalabro burocrático – que faz da legislação tributária brasileira uma das mais extensas e confusas do mundo (e injusta, diga-se de passagem). Porém, entra governo sai governo, e o projeto não anda. Desta vez, ainda que seja “vencida pelo cansaço”, a reforma se tornou pauta prioritária de votação no Congresso antes do recesso parlamentar. Depois disso, é difícil ter quórum para votar uma mudança na Constituição, que exige 308 votos, em dois turnos. Soma-se a isso, o fato de o texto base já ter passado por comissões do Congresso, o que facilita a sua tramitação. Acima de tudo, é um projeto encaminhado pelo governo que tem o DNA do Legislativo, o que permite dividir o ganho político entre os dois poderes.


O âmago da reforma tributária está na mudança da forma de cobrança dos impostos: ao invés da “origem”, os impostos passarão a ser cobrados seguindo o princípio do “destino”. Assim, os tributos serão calculados tendo por base a região em que se encontra o consumidor do bem ou serviço e não mais pelo local em que o produto ou serviço é produzido. Em resumo, ao invés de tributar a “oferta”, como é atualmente, o governo passa a cobrar os impostos sobre o “consumo”. Obviamente, estados grandes produtores, como São Paulo, poderão ter grande perda de arrecadação e deverão ter um mecanismo de compensação. De todo modo, a reforma terá o mérito de estimular a descentralização industrial.


Outro objetivo da reforma tributária é a simplificação da arrecadação e a modernização do Fisco. Nesse sentido, haverá uma unificação dos impostos nos três níveis de governo. No caso federal, a legislação do PIS/Cofins tem mais de 2 mil páginas de regras e regimes especiais (só o índice tem 60 páginas!) que mostram que o atual regime fiscal está à beira do colapso. Pela proposta, esses dois impostos, e mais o IPI, seriam substituídos pelo Imposto do Valor Agregado (IVA) de tributação do consumo – regime já adotado, com êxito, por 174 países. A intenção é reduzir a burocracia para as empresas e facilitar o ingresso de investimentos estrangeiros.


O ICMS estadual e o ISS municipal serão extintos e substituídos por um único imposto sobre bens e serviços – o IBS. A dúvida é sobre como será recolhido esse imposto e como se dará a transferência para estados e municípios? Isso seria feito pelo Conselho Federativo do IBS. Esse Conselho, tem gerado muita discussão por prefeitos e governadores porque, na proposta do relator, ele teria muito poder. além de arrecadar o novo imposto, efetuar compensações e distribuir os resultados aos estados e municípios, teria poderes para legislar normas e resolver conflitos entre os membros. A própria formação do Conselho não é consenso. São Paulo, o estado mais atingido pela mudança da cobrança da “origem” pelo “destino”, propõe que seja levado em conta o tamanho da população, fator que o beneficiaria.


Outro ponto de avanço na reforma tributária é o fim da cumulatividade dos impostos, o chamado “imposto em cascata”, o que fará com que a tributação seja a mesma, independentemente do tamanho da cadeia produtiva. Segundo o governo, a reforma prevê a criação de uma alíquota única, sem aumento da carga tributária atual, sobre o consumo (hoje fica próxima a 25%). Uma outra alíquota, 60% menor, que incidirá sobre alguns bens e serviços especiais (remédios e transporte público, por exemplo) é outra novidade. Por último, será criada uma alíquota zero para uma lista de produtos da cesta básica. Os produtos que ficarem de fora dessa lista terão alíquota reduzida em 60%, caso o projeto, aprovado em dois turnos na Câmara, não sofra alterações no Senado.


Não há espaço para uma discussão mais técnica do projeto de reforma tributária. No papel, tudo certo. Como definiu o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, é um projeto “ganha-ganha “. A previsão do ministério, é que a reforma vai gerar um crescimento adicional da economia entre 12% e 20%, num período de 10 a 15 anos e a criação de 12 milhões de novos empregos. A reforma também terá um efeito desinflacionário, na medida que a redução de custos das empresas permitirá uma diminuição dos preços ao consumidor.


O Instituto de Pesquisas Econômicas e Aplicadas (Ipea), órgão ligado ao governo, prevê que uma alíquota única já reduz a carga tributária dos mais pobres. Com o sistema de cashback (devolução do imposto) é possível reduzir o peso dos impostos em 50% para os mais pobres. Ainda segundo o Ipea, apenas os 10% mais ricos vão pagar mais impostos; os outros 90% da população terão uma carga tributária menor. Parece mágica, não é mesmo? E o que mais surpreende é porque uma proposta quase consensual levou tanto tempo para ser votada pelo Congresso. Na realidade, a reforma administrativa ainda levará mais uma década para ser totalmente implementada. Mais ou menos equivalente ao tempo perdido pela inépcia dos nossos dois últimos governos.

21 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo

8 de janeiro

Comments

Rated 0 out of 5 stars.
No ratings yet

Add a rating
bottom of page